#1 - Escrever um livro de ficção
- Daniela Martinho

- 23 de ago.
- 3 min de leitura
Atualizado: 31 de ago.
Vou escrever um livro, mas não sei como.
Sinto-me como uma personagem saída do livro Diário de um Banana. Sou, neste caso, a personagem Banana, a autora de uma história que ainda não passou de uma ideia.
O meu primeiro livro de ficção.
Até agora, os meus dois livros de poesia surgiram de forma natural e espontânea. O processo de escrita foi, sem dúvida, uma das melhores experiências da minha vida. Mas, quando decidi aventurar-me na escrita de ficção, tudo mudou.
Foi uma decisão leviana, fruto da (pouca) experiência que tinha tido e de um mundo que pouco conhecia. Apesar de ter alguns rascunhos guardados em diferentes documentos e na cloud, nenhum deles serviu de base para a história que estou agora a escrever. E fiquem descansados: não haverá spoilers sobre o enredo. Quero, antes, partilhar o percurso — as dúvidas, as hesitações, os momentos de caos e esperança, de alguém que não percebe nada disto.
Por isso, vamos começar pelo início.
Primeiro, surgiu a questão fundamental: — Sobre o que vou escrever?
Perdi bastante tempo à procura de um tema que se encaixasse na minha voz de autora. Há tantos temas e situações que se podem abordar, hoje em dia, mas nada parecia captar a essência do que realmente quero dizer. Ainda assim, peguei num desses rascunhos e tentei construir uma narrativa, com base nas minhas leituras recentes. Dei-lhe um título, criei personagens com nomes estrangeiros, tracei um enredo. Porém, não me conectava com as personagens, não sabia de onde elas tinham vindo, e nem sequer tinha definido tempo e espaço. Sem esses elementos, não tinha um livro.
Tentei confiar no processo (risos desesperados) e aceitar que o caminho que tinha escolhido não era o que realmente precisava. Foi nesse caos de questões existenciais que me lembrei de uma conversa que tive com o meu pai há uns meses atrás.
*flashback* No ano passado, o irmão do meu pai faleceu, e a dinâmica da nossa família mudou, especialmente, na relação com a minha família paterna. Vivemos em lados opostos de Portugal, por essa razão, o meu pai começou a viajar regularmente para cuidar dos meus avós e dos seus seus rendimentos. Passou assumir responsabilidades que, até então, nunca tinha de enfrentar, por ser o irmão mais novo.
Um dia, há uns meses atrás, muito antes de a ideia do livro surgir, o meu pai perguntou-me se não queria escrever sobre a história dos meus avós, lembrando-me que devia aproveitar enquanto eles ainda estavam vivos para lhes perguntar tudo o que se lembrassem. Como boa filha que sou, não segui o conselho do meu pai. Mas, naquele momento, nasceu dentro do meu inconsciente uma semente — uma ideia que começava a germinar.
Porém, essa ideia não surgiu da história de vida dos avós paternos. Decidi procurar respostas do lado da família da minha mãe. E, aqui, a tarefa não era fácil. O meu avô materno já tinha falecido e a minha avó materna, devido às suas condições de saúde, tinha a memória fragilizada, agravada pelos anos de medicação constante.
Perguntar-se-ão: por que, sabendo destas condições, decidi seguir em frente e entrevistar a minha avó?
Porque, de alguma forma, algo me dizia que estaria a encontrar o caminho para o pote de ouro. Confiei no meu instinto, e segui o meu coração, e isso fez toda a diferença. O pouco que consegui recolher naquela entrevista serviu de combustível para trabalhar intensamente naquilo que queria descobrir. Sempre quis fugir à ideia de escrever uma história baseada em factos verídicos, até que a personagem principal surgiu.
A personagem surgiu antes do enredo. Uma memória perdida da infância do meu pai foi o que deu início ao primeiro capítulo. Uma época, um espaço, uma sensação que, aos poucos, foi ganhando espaço para ficção. E, assim, percebi o que queria contar.
Tudo começou, afinal, com o meu pai.



Comentários