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#2 - Entre bloqueios e renascimentos

Atualizado: 31 de ago.

Vou escrever um livro, mas não sei como.

No meu último post, tinha escrito sobre como surgiu a história em que estou atualmente a trabalhar. Queria partilhar convosco um episódio específico que me deu esperança e vontade de (re)escrever o meu primeiro livro de ficção.


Quando sentimos inspiração para escrever, nada nos impede de o fazer. Somos como um comboio em alta velocidade, sem travões. O som de cada tecla a bater, os pensamentos a fluírem para as páginas do documento. E, de repente, chega o primeiro obstáculo nesta viagem o bloqueio criativo.


Nunca percebi bem por que chamam bloqueio criativo, pois é exatamente a parte da criatividade que me falta. Este bloqueio não é pintado de cor-de-rosa, nem decorado com rosas; é turbulento, decisivo e, por vezes, assustador. Parece que nada consegue demovê-lo ou afastá-lo. Simplesmente chega para nos arrastar até ao fundo do poço. Vamos recuar ao início, ao antes do problema.


Já tinha escrito vinte e sete páginas, com capa, prólogo e capítulos bem organizados. Frases com significado, descrições belas e equilibradas.

E, de repente, fiquei sem palavras. Literalmente.

O meu livro morreu na praia, mais precisamente, nas vinte e sete páginas.


Comecei a reler o que tinha escrito. Nada.

Afastei-me do computador, em busca de inspiração. Nada. Dormia, não tinha sonhos. Nada.


Cada minuto parecia arrastar-se para um infinito de horas, sem qualquer pingo de imaginação que pudesse preencher aquele esboço.

Tinha começado o meu primeiro livro de ficção e tinha parado no início. E o que poderia ser pior? Nunca, mas nunca façam esta questão, porque o destino parece estar à escuta, preparado para dar-vos a pior lição. A minha surgiu logo depois do bloqueio criativo. E agora perguntam: O que poderá ser pior do que o bloqueio criativo?


Perder tudo o que escreveram, respondo-vos. Sim, perdi tudo o que tinha escrito, por um erro trapalhão da minha parte. Consegui apagar o documento sem querer e, após várias tentativas falhadas, não consegui recuperá-lo. Procurei tutoriais no YouTube, pesquisei no Google infinitas vezes, pedi ajuda ao meu companheiro, e nada feito. O rascunho foi engolido por um buraco negro digital e lá ficou preso e sem vida. Em menos de uma hora, vivi todas as fases do luto: negação, raiva, depressão e, por fim, aceitação.


E a segunda questão é: como ganhamos forças para reescrever tudo de novo?

Não ganhamos. Aliás, não somos nós que conseguimos essas forças. São as vozes na nossa cabeça que não se calam durante a noite; é o desejo de ver o livro a ganhar vida própria pelas nossas palavras; e, por vezes, são as pessoas certas ao nosso redor que dizem a coisa certa, no momento certo. Por isso, devo os créditos ao meu companheiro, que, no meio do caos e do desespero, disse:

Tu consegues fazer de novo. Ainda está tudo fresco na tua memória. Aliás, até consegues escrever melhor do que aquele rascunho. Foi essa última frase que me deu a última força para recomeçar. Querer ultrapassar aquelas palavras tão bonitas que uma vez escrevi e perdi — essa foi a minha verdadeira motivação. Reescrevi tudo. Algumas partes que ainda me lembrava, outras do zero. Dei uma nova vida à história, e ela renasceu das cinzas.


No final, percebi que, apesar do caos, do desespero e daquele buraco negro digital que engoliu o meu rascunho, a esperança e a vontade de criar são mais fortes do que qualquer travão invisível.

Afinal, se conseguir reescrever tudo de novo (quase melhor do que antes), então talvez o bloqueio criativo seja só uma brincadeira de mau gosto que a vida nos prega de vez em quando. E, se alguma vez se encontrarem na minha situação, lembrem-se: a melhor forma de vencer o bloqueio (não) criativo é literalmenterecomeçar. Ou, pelo menos, tentar. Porque, no fundo, a criatividade também gosta de uma boa dose de humor... e de uma segunda oportunidade.

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